quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

A Televisão e os Valores





          Nos últimos tempos, a televisão tem sentado no banco dos réus como a principal suspeita pelas inversões de valores, violência e descalabros sociais. Defensores afiados em suas críticas contra os programas televisivos tem anunciado a presença de uma sociedade acéfala, incapaz de refletir e analisar os programas assistidos, aceitando compassivamente todas as idéias propostas por esse instrumento de comunicação. Os brados são muitos e chegam a propor, de forma saudosista, programas antigos que não exponham e não deturpam a moralidade. Gritam, os moralistas, que os adolescentes são as principais vítimas, pois são os mais suscetíveis a essa ameaça. Dizem também, que a camada popular, porque ignorante e não dotadas de senso crítico, são vítimas dos interesses megalômanos e capitalistas das grandes corporações e empresas capitaneadas pelas classes ricas. 
          Mas até que ponto tudo isso é correto? Por que atribuir à televisão a culpa por todas as mazelas sociais? Então, a educação, a moralidade, a ética e os valores em geral foram transformados pelos programas de televisão? Eles têm tanto poder assim? E por que não fazer uma análise mais profunda e compreender se os pressupostos elencados acima são realmente validados?
          Essa discussão com toda certeza daria muitos elementos e, por isso, seria demasiadamente longa. No entanto há como discutir, refutar ou aceitar certos pressupostos. Não devemos delegar à televisão toda a dificuldade e problemática presente em nossa sociedade. Não devemos creditar o sucesso da televisão e a situação social, econômica e cultural de uma camada populacional à ignorância e falta de senso crítico. Não devemos generalizar e indicar que todos os programas televisivos são de mau gosto e, por fim, mesmo aceitando que a televisão traz certos malefícios aos adolescentes, ela também é (e poderá ser) um grande instrumento de educação, cultura e lazer. 
          A televisão é um instrumento e, como todo instrumento, seu efeito será de acordo com o uso que se faz dela. Se abandonarmos o pensamento mítico e usarmos de nossa criticidade, poderemos "despersonificar" o aparelho “televisão” e atribuir aos verdadeiros culpados as transformações que vivenciamos. Somos nós que devemos cobrar qualidade e, quando não há, somos nós que devemos nos negar a participar. Agora, participamos quando reconhecemos que algo faz sentido e parte de nossa vida. Oras, se encontramos audiência para a banalidade, será que a banalidade não está presente em nossa vida e fazendo sentido? Será que a televisão não vem apenas refletir o que já está presente em nós. A dimensão criativa da televisão não é tão grande a ponto de transformar toda a sociedade num sopro só. Senão, seria muito fácil "consertar". Então exibiríamos sempre um programa considerado de "qualidade" e a sociedade tornaria uma sociedade de "qualidade". Mas não é bem assim que funciona. Há muito elemento envolvido. É apropriando-se adequadamente de um instrumento que teremos respostas adequadas. E os adjetivos "adequados" e "qualidade" são muito pessoal, subjetivo que não me atrevo a determinar padrões. O que para mim é qualidade, para outros, não.
          Se somos críticos a ponto de reconhecer a baixa qualidade, a violência e as inversões de valores em determinados programas televisivos, devemos ser críticos o bastante para reconhecer que muitos programas trazem neles uma consciência coletiva do que somos, de como estamos e para onde vamos. O que isso indica? Que diante desses programas podemos fazer várias e sérias reflexões sobre a nossa realidade em vez de negar-se única e exclusivamente em assistir.
          Agora, seria de um mau gosto e acrítico culpabilizar a camada popular pelo sucesso dos programas de "baixa qualidade" devido à "ignorância" e falta de "cultura". Quem, ainda hoje, usa esses adjetivos para indicar uma determinada classe ou povo, tem muito que aprender e conhecer melhor esse mesmo povo. Não podemos aceitar esse discurso reducionista e generalizante, pois quem carrega esse discurso tem pouca vivência e desconhece a sabedoria popular e as habilidades forjadas na vida de um ser humano. Como ser humano, não devemos repudiar ou excluir outro humano, diferenciando pelo poder intelectual, pelo grau de erudição ou escolarização. Esse artifício é o mesmo usado para encontrar, (não sei se é o termo adequado) uma raça perfeita. Como crítico, defensor da ética humana, não aceito ouvir um falar tão preconceituoso e cheios de maus ditos.
          Se nossa sociedade não caminha bem, se não temos mais respeito um pelo outro, se nossa cultura decaiu e nossa moralidade extinta, se nossos filhos não sabem mais respeitar os valores que tanto preservamos e se a nossa vida anda muito complicada, não é culpabilizando a televisão que teremos uma resposta. Não teremos enquanto usarmos do artifício da culpabilização. Porque culpando alguém, tira-nos a responsabilidade de se envolver e de, junto, buscar uma solução. Porque culpando alguém ou alguma coisa, podemos, temporariamente, dizer-nos que estamos livre da responsabilidade dos efeitos que a sociedade nos apresenta. E isso não é ser crítico e sim comodista. Não é ser sábio e sim traidor.


domingo, 1 de novembro de 2009

Redescobrindo a Segunda Guerra




Em primeiro de setembro, foram completados setenta anos do início da Grande Guerra e, por isso, meu post é dedicado a esse acontecimento, caracterizado como o pior erro já cometido pela espécie humana.
Hoje em dia, a Segunda Guerra Mundial ainda é um dos temas mais importantes da História da humanidade. A exemplo da relevância e atualidade do tema, a National Geographic produziu um excelente documentário chamado Redescobrindo a Segunda Guerra, que aborda o conflito de uma maneira inovadora, visto pelas lentes das câmeras que filmaram as batalhas, os massacres e o dia-a-dia dos soldados e dos civis.
O documentário aborda desde a subida de Hitler ao poder e ascensão do nazismo na Alemanha até o fim da guerra com a tomada de Berlim, as bombas atômicas lançadas em Hiroshima e Nagasáki e a rendição do Japão. São mostradas as mais importantes batalhas, as estratégias das duas frentes de guerra, a frieza dos nazistas e do exército alemão, a obediência dos generais de Hitler, o Holocausto, etc. Porém, o que mais chama a atenção em Redescobrindo a Segunda Guerra é o convívio da população civil com os bombardeios, com a fome e, sobretudo, com o racismo.
Diferentemente da grande maioria dos documentários sobre Segunda Guerra, a série da Natgeo foi produzida exclusivamente com vídeos feitos durante a guerra e que foram coloridos por computador, dando maior credibilidade às cenas. A realidade substitui a dramatização, tornando o documentário o mais fidedigno possível.
O documentário cria condições para repensarmos sobre o imperialismo e o racismo, que foram os principais fatores que geraram a guerra, e nos permite compreender a História da Segunda Guerra sob o olhar daqueles que vivenciaram o conflito.
Mais que uma série, Redescobrindo a Segunda Guerra é um exercício de reflexão sobre o maior genocídio cometido pelo homem, que deixou mais de 50 milhões de mortos e inúmeros feridos em todo mundo.
Logo abaixo, há uma lista com todos os episódios do documentário, disponibilizado no youtube. Uma bela aula de história produzida pela Natgeo.

Redescobrindo a Segunda Guerra:
http://www.megaupload.com/?d=I8REA8XF

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

É preciso reconceituar o jornalismo





Por Marcelo Salles

Não faz mais nenhum sentido chamar de Jornalismo o que fazem as corporações de mídia. Quem se preocupa com o lucro em primeiro lugar não é uma instituição jornalística. Não pode ser. Quando uma empresa passa a ter como principal meta o lucro, essa empresa pode ser tudo, menos uma instituição jornalística. E aí não importa a quantidade de estrutura e dinheiro disponível, pois a prática jornalística é de outra natureza. Exemplo: eu posso passar uma semana no Complexo do Alemão com um lápis e um bloco de papel. Posso chegar até lá de ônibus. Posso bater o texto num computador barato. Mesmo assim, se a publicação para onde escrevo for jornalística, vou ter mais condições de me aproximar da realidade do que uma matéria veiculada pelas corporações de mídia.

Essas podem dispor de toda a grana do mundo, de carro com motorista, dos gravadores mais caros, das melhores rotativas, de alta tiragem e de toda a publicidade que o dinheiro pode comprar. No entanto, se não forem instituições jornalísticas, elas dificilmente se aproximarão da realidade da favela, isso quando não a distorcem completamente.

Existem outros exemplos para além da questão da favela. É o caso dos venenos produzidos pelas Monsantos da vida, que nunca são denunciados pelas corporações de mídia. Ou da retomada dos movimentos de libertação na América Latina, vistos como “ditatoriais”; a perseguição aos movimentos sociais e aos trabalhadores em geral; a eterna criminalização da política, de modo a manter as instituições públicas apequenadas frente ao poder privado. Enfim, você pode olhar sob qualquer ponto de vista que não vai enxergar Jornalismo.

Isso precisa ficar bem claro. Claro como a luz do dia. Para que as corporações pareçam ridículas quando proclamarem delírios do tipo: “somos democráticas”, “únicas com capacidade de fazer jornalismo”, “imparciais” e por aí vai. Fazer Jornalismo não tem esse mistério todo. Em síntese, é você contar uma história. Essa história deve ter alguns critérios que justifiquem sua publicação. Alguns deles aprendemos nas faculdades e são válidos; outros são ensinados, mas devem ser vistos com cautela. E outros simplesmente ignorados. Mas, no fundo, o importante é ser fiel ao juramento do jornalista profissional: “A Comunicação é uma missão social. Por isto, juro respeitar o público, combatendo todas as formas de preconceito e discriminação, valorizando os seres humanos em sua singularidade e na sua luta por dignidade”.

Essa frase, quase uma declaração de amor, não é minimamente observada pelas corporações de mídia. Vejamos: elas não têm espírito de missão, não respeitam nada, nem as leis, estimulam o preconceito, discriminam setores inteiros da sociedade, violam os direitos humanos e não sabem o significado da palavra “dignidade”. 

Mas por que o Jornalismo é tão importante para uma sociedade? Porque hoje, devido ao avanço tecnológico dos meios de comunicação – são praticamente onipresentes nas sociedades contemporâneas –, a mídia assume uma posição privilegiada no tocante à produção de subjetividades. Ou seja, a mídia, mais do que outras instituições, adquire enorme poder de produzir e reproduzir modos de sentir, agir e viver. Claro que somos afetados por outras instituições poderosas, como Família, Escola, Forças Armadas, Igreja, entre outras, mas a mídia é a única que atravessa todas as outras.

Fica claro, portanto, que uma sociedade será melhor ou pior dependendo dos equipamentos midiáticos nela inseridas. Se forem instituições jornalísticas sólidas e competentes, mais informação, dignidade, mais direitos humanos, mais cidadania, mais respeito, mais democracia. Se forem corporações pautadas pelo lucro, ou seja, entidades não-jornalísticas, menos informação, menos dignidade, menos direitos humanos, menos cidadania, menos respeito, menos democracia.

É por isso que eu sempre digo aqui, neste modesto, porém Jornalístico espaço: as corporações de mídia precisam ser destruídas, para o bem da humanidade! Em seu lugar vamos construir instituições jornalísticas. Ponto.

Revista Caros Amigos - Outubro de 2009.


segunda-feira, 5 de outubro de 2009

Corrida Olímpica




Em entrevista para o programa Roda Viva na última semana, na TV Cultura, o Ministro do Esporte Orlando Silva disse que o Brasil estava na pole-position da disputa para sediar os Jogos Olímpicos de 2016. Uma semana depois, após o investimento (leia-se gasto) de mais de 100 milhões de reais na campanha Rio-2016 e a vitória épica na corrida para realizar as Olimpíadas, será que nós, brasileiros, já podemos comemorar?

A escolha do Brasil para sediar a Copa do Mundo de 2014 e o atual momento econômico do país, recentemente incorporado entre as grandes potências mundiais, facilitou a escolha do Rio de Janeiro para realizar as Olimpíadas de 2016. Entretanto, essa realização não deleta de nossa memória o presente quadro esportivo do Brasil e nem sua aviltante realidade social, corroborada pela pífia 75ª posição de seu IDH no ranking divulgado este mês pelas Nações Unidas.

A realização dos Jogos Pan-americanos de 2007 no Rio foi uma verdadeira orgia com o dinheiro público. Os gastos na construção de arenas e preparação da cidade foram exorbitantes, excedendo muito o valor que inicialmente se previa. O superfaturamento das obras e o abandono de centros olímpicos após o Pan evidenciam o desvio de verbas, a frouxa fiscalização e a falta de compromisso do governo em promulgar políticas públicas para o esporte no país.

O Brasil nunca foi um país com elevado potencial olímpico e dificilmente se tornará uma referência esportiva em apenas sete anos. Não é de hoje que os atletas brasileiros têm de se prostituir para conseguir patrocínios, pois quase não há incentivos e nem mesmo estrutura para a formação de atletas, sobretudo nas modalidades individuais. Além disso, sequer temos uma cultura esportiva no Brasil.

A realização dos jogos de 2016 no Rio de Janeiro provavelmente será mais uma estratégia política para efetivar a lógica da corrupção e instrumento de desvio de dinheiro público no país. Serão construídas belíssimas arenas esportivas que servirão para maquiar os problemas sociais do Brasil, ofuscando as favelas e a violência que não serão mencionadas pela facciosa potência midiática brasileira, a Rede Globo, assim como foi feito no anúncio da escolha do Rio como sede olímpica, quando mostraram somente os brasileiros em festa e esqueceram (leia-se ocultaram) a realidade.

Com certeza, aquele brasileiro que mora no sertão nordestino, aquele cidadão ribeirinho do Amazonas ou o pequeno agricultor do interior de Goiás sequer saberão que os Jogos Olímpicos serão realizados em seu país. A maioria dos brasileiros no máximo assistirá uma festa pela televisão sem descobrir os reais benefícios da realização das Olimpíadas de 2016 no Brasil. Até mesmo os cariocas, que serão beneficiados por uma relativa melhoria da infraestrutura de sua cidade e aumento no turismo, ainda continuarão convivendo com a violência e com a pobreza.

A partir de agora, cabe aos brasileiros a laboriosa tarefa de fiscalizar o destino das verbas que serão empregadas nas obras no Rio de Janeiro. Devemos reivindicar a efetivação de políticas públicas eficientes para o esporte, como o investimento e criação de bases esportivas e centros de excelência, patrocínio aos atletas, simbiose entre educação e esporte nas escolas e universidades, incentivos à prática esportiva, etc. Somente dessa maneira poderemos evitar o desvio de verbas públicas e criar uma cultura esportiva no país, aumentando nosso quadro de medalhas e ganhando essa corrida olímpica. Assim, talvez tenhamos algo a comemorar com as Olimpíadas de 2016.